A Bauhaus pretendia livrar a arquitetura dos ornamentos burgueses, se desfazendo de padrões ultrapassados e revelando estruturas ocultas. Assim, um edifício é reduzido à síntese perfeita – um cubo de concreto. Com três horas e meia de duração, “O Brutalista” não pode ser considerado como uma síntese. Muito menos perfeita.
Indicado em dez categorias do Oscar, inclusive melhor filme, “O Brutalista” trata de um sobrevivente do Holocausto que migra para os Estados Unidos. Interpretado por Adrien Brody, favorito ao prêmio de melhor ator, László Tóth é um arquiteto judeu que foi treinado na Bauhaus, a escola de design vanguardista.
No país, László é acolhido por Atilla, um primo em avançado processo de americanização. Dono de uma loja de móveis na Filadélfia, ele é casado com uma mulher católica que, com o tempo, começa a se incomodar com a presença do estrangeiro – na verdade, não é só um incômodo com as suas diferenças, há também uma problemática tensão sexual.
Um dia, um rapaz aparece na loja de móveis querendo surpreender o pai milionário com uma biblioteca repaginada. E, assim, László acaba conhecendo Harrison, personagem vivido por Guy Pierce – que funciona, durante o filme todo, como um símbolo mais do que óbvio da elite americana no período pós-guerra.
A princípio, Harrison fica horrorizado com a reforma radical e enxota o arquiteto de sua mansão, provocando um prejuízo gigantesco aos negócios de Atilla e à situação já bastante precária de László. Meses depois, o ricaço acaba reencontrando o arquiteto para contratá-lo – depois, é claro, de ficar sabendo sobre o seu passado ilustre na Europa.
Para os brasileiros, é difícil enxergar os americanos pelo o que realmente são, isto é, caipiras. Se os brasileiros sonham com uma casa brega em Miami, os americanos sempre desejaram uma vida cosmopolita na Europa. O que alguém de Balneário Camboriú vê na Disney, um americano médio vê em Paris – isto é, um símbolo de status, de distinção.
Harrison é um chucro que, apesar de todo o dinheiro do mundo, não conseguiu ser o que ele realmente gostaria de ter sido – um intelectual, um artista, alguém como László. “O Brutalista” trata de um país disposto a acolher os “exaustos e famintos”, como diz a velha inscrição na Estátua da Liberdade, desde que essas “massas amontoadas” representem algum tipo de ganho.
Algumas das mentes mais brilhantes do século 20 tiveram de abandonar os seus países às pressas e os Estados Unidos não acolheram esses refugiados por bondade ou decência, mas pelo o que tinham a oferecer. Muitos, inclusive, tornaram Hollywood no que ela é hoje – judeus como Ernst Lubitsch, Fritz Lang e Billy Wilder.
É uma pena que “O Brutalista” não seja também dirigido por um judeu. Em um ano em que o tema da apropriação cultural foi tão discutido, graças a um diretor francês que quis fazer uma história passada no México, sobre assuntos específicos ao México e sem o envolvimento de mexicanos, Brady Corbet não fica muito atrás.
E que grande ironia! Um jovem diretor com ligações muito tênues ao judaísmo (sua mãe teria tido parentes judeus bem distantes) ou à vivência dos imigrantes na América tratar de uma trama em que o talento de um artista judeu é sugado por um americano em busca de reconhecimento e glória – e tudo isto receber dez indicações ao Oscar.
Com “O Brutalista”, Corbet achava que revelaria, por debaixo dos ornamentos burgueses, a verdadeira estrutura dos Estados Unidos, a exploração dos estrangeiros que construíram o país. Com ambições faraônicas e uma segunda parte que trata de literalizar todas as suas figuras de linguagem, o diretor só revelou inépcia e vaidade.