Aos 24 anos de idade, Paul Schrader escreveu “Estilo Transcendental no Cinema”, um estudo das obras de Robert Bresson, Yasujiro Ozu e Carl Theodor Dreyer – foi inspirado em “Diário de um Padre” (1951), de Bresson, que ele também escreveu o roteiro de “Taxi Driver” (1976), clássico dirigido por Martin Scorsese. Se Scorsese não tivesse dirigido “Silêncio” (2016), Schrader teria assumido o seu lugar, mas é provável que “First Reformed” (2018) nunca tivesse sido feito, o que seria uma pena.
Com Andrew Garfield e Adam Driver no elenco, “Silêncio” se passa no século XVII, quando dois padres jesuítas de Portugal viajam até o Japão, durante um período de perseguição da fé católica no país. Já “First Reformed” (também traduzido como “Fé Corrompida”), é ambientado nos dias atuais e trata do processo de auto-destruição de um padre protestante, interpretado por Ethan Hawke. Enquanto “Silêncio” se passa em um mundo que podemos imaginar, “First Reformed” representa o mundo como o conhecemos.
Também inspirado em “Diário de um Padre” e no próprio “Taxi Driver”, “First Reformed” trata do Reverendo Ernst Toller (Hawke), responsável por uma pequena igreja histórica no estado de Nova York. Com pouquíssimos fiéis comparecendo às missas, a igreja é vista pela comunidade como uma atração turística, tem até uma loja de lembrancinhas. Toller perdeu um filho, viu o seu casamento ser desfeito e está cada vez pior de saúde. Quando Mary (Amanda Seyfried) pede que o padre aconselhe o seu marido Michael (Philip Ettinger), as coisas só pioram.
Michael é um ativista ambiental que não consegue aceitar a gravidez de Mary porque ele acredita que o planeta já está condenado. Também em crise, Toller não sabe muito bem como reconfortá-lo. Já disponível na Netflix, “First Reformed” é como uma jornada no desespero crescente de um padre incapaz de encontrar uma resposta satisfatória ao estado do mundo em que vivemos. O diário que ele mantém revela, ao mesmo tempo, uma crise de fé e uma epifania política, um cenário em que atitudes extremas começam a parecer urgentes.
Mesmo não sendo um filme de terror, algumas das técnicas usadas pelo diretor, sobretudo nos departamentos do som e da fotografia, remetem ao gênero. O que provoca angústia, no entanto, não é uma presença maligna, mas a ausência de Deus. Um dos filmes mais potentes de 2018, “First Reformed” não foi reconhecido nas principais premiações do ano, mas a performance impressionante de Ethan Hawke (talvez, a melhor de toda a sua carreira) foi vitoriosa em diversos circuitos independentes, assim como o roteiro original de Schrader.