No final da década de 1990 e início dos anos 2000, o cinema sul-coreano se revitalizou, conquistando sucessos domésticos que superaram as bilheterias de Hollywood e atraindo o reconhecimento internacional. Em 2004, Chan-wook Park venceu o Grand Prix de Cannes, o segundo prêmio de maior prestígio do festival, com o violento “Oldboy”. Neste ano, finalmente, a Coreia do Sul levou a Palma de Ouro. Com “Parasita”, Joon-ho Bong se tornou o primeiro diretor do país a vencer a honraria máxima.
Além do prestígio artístico, o diretor também desfruta do sucesso comercial. Tanto “O Hospedeiro”, de 2006, como “Expresso do Amanhã”, de 2013, são alguns dos filmes mais lucrativos da história do cinema coreano. “Parasita”, no entanto, já é responsável pela maior bilheteria de sua carreira, ultrapassando a marca dos US$100 milhões no mundo todo. Quando lhe perguntaram o que ele achava da Academia nunca ter premiado um filme coreano com o Oscar, Bong respondeu: “É um pouco estranho, mas não importa. Não é um festival internacional, eles são bem locais” – mas “Parasita” deve corrigir esta injustiça em 2020.
Acostumado a retratar azarões lutando contra o sistema, Bong nasceu durante a ditadura militar, perto de uma base do exército americano. Parte de sua família foi separada durante a guerra da Coreia e passou a viver na Coreia do Norte, de onde não podiam sair. A mãe e a tia do diretor ficaram 56 anos sem se ver, até um dos raros encontros promovidos com autorização do Norte, em 2006. Na juventude, estudou sociologia na Universidade de Yonsei e participou dos protestos pela versão coreana das “Diretas Já”, após a morte de um estudante torturado pela polícia.
Com uma mistura de removedor de tinta e água, Bong fazia coquetéis Molotov “humanitários”, menos perigosos do que os de gasolina: “O outro lado era formado por jovens como nós que foram alistados ao serviço militar e enviados ali, então não queríamos machucá-los”. Sua filmografia, que mistura suspense, terror, drama e comédia, é permeada pela memória de uma nação dividida e castigada por forças autoritárias. Seus filmes, no entanto, nunca são didáticos ou enfadonhos. Os personagens não são ativistas políticos, mas pessoas comuns que se veem embrenhadas em um mecanismo muito maior do que elas mesmas.
Em “Parasita”, uma família pobre elabora um plano para trabalhar na casa de uma socialite. Com indicações falsas e diplomas forjados, passam a ocupar os cargos de professor particular, arte-terapeuta, motorista e empregada doméstica, tudo na base da mentira e da dissimulação. Isto é tudo o que você precisa saber sobre o enredo, que é cheio de surpresas e reviravoltas. Trata-se de um filme sobre planos frustrados, tentativas de ascensão social que não funcionam porque as regras do jogo são diferentes para cada jogador. O elenco é encabeçado pelo brilhante Kang-ho Song, colaborador habitual do diretor desde o suspense “Memórias de um Assassino” (2003).
Em entrevista, o ator disse que “Parasita” é o produto final de toda a obra do diretor, que inclui também o drama “Mother – A Busca Pela Verdade” e a ficção-científica “Okja”, este último produzido e distribuído pela Netflix. Aos 50 anos de idade, Joon-ho Bong é uma das vozes mais criativas e maduras do cinema mundial, transitando com facilidade por gêneros diversos e sempre misturando entretenimento com comentário social. “Parasita” é, sem dúvida, o cume de duas décadas vibrantes do novo cinema coreano.