Faz parte do argumento conservador o repúdio à arte moderna. É comum, por exemplo, compararem pinturas naturalistas com quadros como “Abaporu”, de Tarsila do Amaral, para insinuar que a obra que melhor representa a realidade é mais difícil tecnicamente e, portanto, boa. Se fosse assim, aqueles retratistas de praça que copiam fotos de celebridades seriam os grandes expoentes da arte mundial, mas por mais que o esforço em reproduzir a realidade com exatidão fotográfica seja enorme, é muito mais difícil criar algo que expresse emoções. E este é o grande desafio da refilmagem de “O Rei Leão”.
A Disney foi bastante esperta divulgando um trailer narrado, em que nenhum animal fala ou canta, porque a dublagem não se encaixa no resultado final. Apesar da expertise técnica, dos detalhes dos olhos e da textura dos pelos, “O Rei Leão” cria um problema que não existia na animação de 1994, isto é, falta expressão, movimento, exagero e leões com sobrancelhas. Falta emoção. Momentos que deveriam ser dramáticos acabam ficando cômicos, porque não é natural ouvir uma voz humana saindo de um leão realista, a não ser que seja um meme.
Dirigido por Jon Favreau, o mesmo de “Mogli – O Menino Lobo”, “O Rei Leão” é um excelente filme para exibir em lojas de televisão 4K Ultra HD, pois a imagem é mesmo linda, mas nada ali causa o mesmo impacto emocional do desenho. Parecia, de fato, uma ótima ideia escalar Donald Glover e Beyoncé para interpretar Simba e Nala, mas as músicas também não fazem jus ao talento dos dois – ambos são ofuscados por Billy Eichner e Seth Rogen, que não são cantores profissionais, mas estão muito bem como os simpáticos Timão e Pumba (os únicos destaques positivos do filme).
Com avaliação de 56% no Rotten Tomatoes, “O Rei Leão” acompanha a tendência recente de refilmagens da Disney que não foram muito elogiadas pela crítica, mas se saíram muitíssimo bem na bilheteria, como é o caso de “Aladdin”, que já faturou mais de US$965 milhões e aparece como “podre” no site. Depois do sucesso de “Alice no País das Maravilhas” (2010), a Disney adotou a estratégia de refilmar todo o seu catálogo de clássicos (“A Pequena Sereia” e “Branca de Neve” estão em produção), uma tática que já rendeu mais de US$ 6 bilhões ao longo dos anos.
Em algum momento, no entanto, esse catálogo de clássicos vai se esgotar e não haverá nada de original para refilmar. Em “O Rei Leão”, o vilão Scar assume o trono e perturba o ciclo da vida, permitindo que as hienas ataquem indiscriminadamente e destruam tudo. Se a Disney continuar esmagando qualquer lampejo de originalidade com a sua caça predatória de remakes, seu reinado também se transformará na Terra das Sombras.