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A constante necessidade de "avançar a trama".
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Há uns dias, um vídeo da crítica Isabela Boscov viralizou no Twitter pela surra elegante que ela deu nos fãs que se queixavam da falta de ação em “The Last of Us”. Didaticamente, ela explicou que a série é uma adaptação do videogame, que é óbvio que ela seria diferente e que quem gosta de ouvir a mesma história repetidas vezes, sempre do mesmo jeito, são crianças.

Não são só os nerds brasileiros que andam reclamando. Nas redes sociais, é fácil encontrar queixas de estrangeiros dizendo que a série nem parece ter zumbis ou, então, que episódios como o terceiro e o sétimo são “fillers”, isto é, encheção de linguiça. Parece que, num mundo ideal, todos os episódios conteriam 50 minutos de Joel atirando nos mortos-vivos e nada mais.

Como “Star Wars – Ascensão Skywalker” bem demonstrou, é inútil tentar agradar aos fãs. Já na fase de produção, houve quem reclamasse da escolha de Pedro Pascal porque o ator não conseguiria ter uma barba cheia como a do personagem – isso sem falar dos nerds que não acharam Bella Ramsey atraente o suficiente para interpretar uma menina de 14 anos.

Todas essas críticas parecem ter origem numa visão simplória (além de machista e homofóbica) do papel da arte, em que as motivações dos personagens não importam e qualquer tentativa de estabelecer um universo minimamente palpável, ao contrário do que a Marvel vem fazendo, são vistas como inúteis porque “não avançam a trama”.

Episódios como o de Bill e Frank ou o de Ellie e Riley (em que finalmente vemos como Ellie foi mordida, por qual motivo ela não quer abandonar Joel e como é a dinâmica entre Fedra e a facção dos Vagalumes), servem para embasar o tema geral da série. “The Last of Us” não trata de um apocalipse zumbi, mas de como as nossas relações se tornam cruciais num contexto de fim de mundo.

Deveria ser óbvio que, anos depois de perder a filha, Joel irá enxergar Ellie como uma substituta e que irá sentir uma forte (e questionável) obrigação de protegê-la, como se salvá-la fosse uma forma de salvar a própria filha retroativamente. Por sua vez, Ellie se vê apegada a Joel por ter perdido todo mundo que importava a ela.

Utilizar flashbacks para fundamentar a ação dos personagens não é uma novidade na televisão, é a mesma estrutura da série “Lost”, em que cada episódio voltava no tempo para conhecermos melhor os sobreviventes da ilha misteriosa. São histórias que “não avançam a trama”, mas nos contam quem são essas pessoas e por que elas agem como elas agem.

Para ter interesse nesse tipo de desenvolvimento, no entanto, é necessário ter um pingo de empatia no corpo – o que, comprovadamente, não é o forte dos nerds. E isto só vem piorando a medida que os produtos consumidos em larga escala (olá, Disney) não favorecem um mínimo de introspecção e coerência interna.

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